domingo, 30 de janeiro de 2011

Para um dia de chuva

"Lá fora está chovendo,
Mas assim mesmo eu vou correndo
Só pra ver o meu amor."
(Que Maravilha; Toquinho)



O dia amanheceu gelado, difícil sair da cama. Olhos semicerrados, tropecei no cobertor e aterrisei no frio chão do quarto. Não havia tempo para preguiça, a dança do percurso era longa: chuva causa frio, confusão e engarrafamentos, o caos da cidade expresso em notas agudas. Mas em nenhum momento me sentia perdendo tempo, sono ou conforto. Buscava um conforto que não havia em outro lugar.

Olhava atentamente as pedrinhas do calçamento, verde-musgo, cor viva de chuva. Me esquivava das poças, pedia direções, mudava de rumo; andei ruas inteiras em vão, voltei, dobrei, segui adiante e só depois de muitos caminhos me achei. Mas, no momento em que cheguei à tua porta, o cronômetro de viagem estava zerado: a jornada começava ali, ou nem tinha acontecido. Tinha percorrido a cidade inteira só pra chegar ao teu ponto de partida.

Teu rosto sonolento ao abrir a porta, o medo que os olhos tem da claridade cegante desses dias nublados. Tudo pura maldade. Corro pra não te despertar por completo, e mais adiante um beijo. Um beijo de sono, de sonho, porque você ainda dormia por inteiro, e eu ia me contagiando novamente por aquele estado de torpor; acertando meus ponteiros com os teus, que nem tinham começado a rodar ainda.

De volta às cobertas é que você se revela para mim. Os olhos que não se abriram por completo agora totalmente cerrados; os vincos do lençol imprimindo na pele do rosto rugas que ainda não possui e os braços pendendo frouxamente em minha direção, procurando ainda, zumbis de um corpo adormecido. E eu vou chegando suavemente, encostando meu corpo devagar para não causar susto, e aos poucos misturo o frio vivo do mundo lá fora ao calor que é só teu.