terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

As palavras, essas danadas!

Tudo que eu queria dizer
Alguém disse antes de mim
Tudo que eu queria enxergar
Já foi visto por alguém

Nada do que eu sei me diz quem eu sou
Nada do que eu sou de fato sou eu

Tudo que eu queria fazer
Alguém fez antes de mim
Tudo que eu queria inventar
Foi criado por alguém

Nada do que eu sou me diz o que sei
Nada do que eu sei de fato é meu
(Pra manter ou mudar, Móveis Coloniais de Acaju)


Acho que todo mundo já sentiu que poderia MESMO ter feito ou dito antes algo que outra pessoa fez ou disse. Seja escrever um texto, uma letra de música ou até elaborar certas teorias científicas (sim, eu sou arrogante às vezes!). Além dos motivos usuais de inveja branca da genialidade dos outros, ainda fiquei indignada porque os caras do ‘Móveis’ escreveram a música aí em cima falando exatamente sobre isso, também antes de mim! Mas mesmo assim resolvi fazer o meu próprio texto, esse curtinho aí embaixo (nascido de leituras de Caio Fernando Abreu):

Certas palavras parecem tão minhas que não consigo aceitar que já foram ditas por outra boca, ou outro lápis. Quando as leio, desejo absorvê-las para além do ato de ler, ou de copiar. Sinto necessidade imperativa de me apossar daquelas palavras que – como é possível? – um estranho disse antes de mim e que me explicam melhor do que eu mesma sou capaz. Sou tomada por um ímpeto de comer, engolir o papel, quero me apropriar daquele pensamento de qualquer forma.

Por que livros não alimentam também a carne? Minha tentativa de conquistar as palavras, de domá-las, chega ao absurdo de querer absorvê-las por minhas mucosas. Tenho ganas de engolir meus livros para assim compreendê-los, desnudá-los completamente. E eu que passei uma vida inteira com a mania estranha de devorar folhas de caderno aos pedacinhos, sem entender porque. Percebo agora: era canibalismo como de algumas tribos de índios. Queria engolir o papel impresso ou o autor inteiro? Meu querer com as palavras sempre foi violento.

Já aquelas que nascem em mim e povoam a minha mente são tiranas. Fogem covardemente quando tento alcançá-las, teleportam-se. Estavam aqui há pouco e quando tento pescá-las – pluft! Já sumiram sem deixar rastro. Ciumentas, invejosas. Basta não dar-lhes atenção – procuro o sono – que vêm dançar diante do meu rosto; se mostram seminuas, límpidas, abundantes, se exibem para mim mas não se entregam. Safadas que são. 


Preservam seu mistério para me fazer ceder às suas vontades.


5 comentários:

  1. Sayozinha danada é você..
    Sensibilidade monstra \o/
    Lindo texto ;)

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  2. Brigada Liazinha! Foram essas danadas aí que não me deixaram dormir ontem! hehehe

    Só consigo dormir quando escrevo, nem que seja em rascunho no celular. ;)

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  3. Gostei, queria ter escrito! :)

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  4. Inveja branca que sinto sempre ao ler cada texto seu...
    Fico aqui pensando: como pode alguém escrever tão bem assim e ainda ter a humildade de elogiar meus textos?



    P.S.: O 'Gotas Azuis' já está na minha barra lateral, na coluna de blogs indicados, e o privilégio é todo meu.

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  5. Todas as palavras, suas. Adorei o texto. =)

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